quinta-feira, 25 de março de 2010

Incineradora, pelo sim pelo não

As razões para a construção duma incineradora para resíduos sólidos urbanos (RSU) na ilha de São Miguel constituem um bom exemplo de argumentação em círculo vicioso:

1- Ricardo Silva, presidente da Associação de Municípios da Ilha de S. Miguel (AMISM), considera que é preciso construir uma caríssima e contaminante incineradora porque os aterros sanitários estão cheios (Telejornal Açores 10/02/2010) e é preciso arranjar uma alternativa para eles.

2- Mas os aterros sanitários estão cheios porque não há suficiente reciclagem. Uma grande parte do volume de lixo que vai para o aterro é, na realidade, reciclável. Se esta parte for reciclada, os aterros sanitários demorariam muito mais tempo a ficar cheios e não haveria problemas na sua gestão.

3- Não há reciclagem, em grande parte, porque não há suficientes ecopontos disponíveis. Por muita vontade que os cidadãos tenham de reciclar o seu lixo, isso é impossível se não há ecopontos onde pô-lo, ou então outro sistema alternativo de recolha.

4- Não há ecopontos suficientes porque as câmaras municipais não os instalam. Um bom exemplo disto é o município da Ribeira Grande, onde há apenas 11 ecopontos para todo o centro urbano (Matriz e Conceição). Para um total de 5.349 moradores, isto equivale a um ecoponto para cada 486 moradores (ver ecopontos).

5- As câmaras municipais não instalam ecopontos por falta de vontade dos seus presidentes. E quem é, com todo isto, o presidente da Ribeira Grande? Evidentemente, o próprio Ricardo Silva.

Isto é, a razão para o presidente da AMISM querer construir uma incineradora é, em grande parte, a falta de vontade do próprio presidente da AMISM em promover a reciclagem. O presidente passa assim um atestado da sua própria incompetência. Um atestado que devem pagar todos os habitantes da ilha!

Entre colocar muitos mais ecopontos para permitir a reciclagem ou construir uma incineradora, a decisão do presidente da AMISM parece ser esta última solução. Independentemente das razões, a escolha de fazer uma incineradora traz grandes vantagens: é uma solução muito mais cara, muito menos ecológica, muito pior para o ambiente e muito pior para a saúde dos munícipes.

E para quem acredite que uma maior reciclagem não é possível, basta olhar para o que acontece na ilha do Faial. No ano passado, a câmara da Horta foi o segundo município do país a recolher mais resíduos de papel e cartão por habitante (Lusa): 305 toneladas (20 Kg./habitante). Na recolha dos plásticos verificou-se um aumento de 64 %, com 28 toneladas (1,79 Kg./habitante). E relativamente ao vidro, a câmara recolheu 154 toneladas (10 Kg./habitante). E ainda há acordos da câmara com várias empresas para o tratamento de pilhas, tinteiros, baterias, medicamentos, óleos usados, pneus e equipamentos eléctricos e electrónicos.

A câmara da Horta ainda investiu na aquisição de novas viaturas para recolha de resíduos e na instalação de novos ecopontos em zonas públicas, escolas, empresas e estabelecimentos comerciais. E tem prevista a aquisição de um separador electromagnético e uma prensa de metais para a central de triagem. Por último, vai proximamente realizar uma experiência piloto de recolha selectiva porta a porta.

Um bom exemplo, sem dúvida, para São Miguel. Falta é sim uma incineradora para queimar determinadas ideias desfasadas e alguma incompetência!

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