“Os Verdes” iniciam processo legislativo de alteração à Lei de Bases do Ambiente.
A Lei de Bases do Ambiente – Lei nº 11/87, de 7 de Abril – vigora há 24 anos, tendo sofrido apenas duas alterações bastante residuais (em 1996 e em 2002) na área do acesso à justiça.
Foi uma lei aprovada por maioria na Assembleia da República (apenas com o voto contra do CDS), tendo sido um diploma unificador e revelador da necessidade do nosso ordenamento jurídico levar o ambiente a ganhar maior relevância na política geral e de constituir, em si, um valor a defender.
De resto, era essa a concepção que a Constituição da República Portuguesa, de uma forma profundamente inovadora e progressista, determinava desde 1976.
Contudo, na perspectiva do PEV, fruto de opções políticas bem evidenciadas, levadas a cabo pelos sucessivos Governos, Portugal ainda não conseguiu atingir um estádio de desenvolvimento onde se possa afirmar que a preservação dos valores naturais é um objectivo em si e que o ordenamento do território é feito de uma forma harmoniosa e respeitadora da promoção da qualidade de vida, de uma gestão racional do espaço e das suas características, bem como dos recursos naturais. Ou seja, muitas vezes essa conservação de património natural e de componentes naturais só é feita quando não interfere com outros objectivos, designadamente de cariz económica, porque quando interfere, não raras vezes os objectivos ambientais ficam totalmente secundarizados ou são mesmo anulados. Outros valores, portanto, têm-se, amiúde, sobreposto a estes princípios e quantas vezes em prejuízo dos objectivos que a Lei de Bases do Ambiente visa proteger. A pressão urbanística, a má gestão territorial de grandes empreendimentos com danos irreversíveis de ordem ambiental e muitas vezes extremamente danosos do ponto de vista social, a gestão muitíssimo deficitária de vastas áreas protegidas, o despovoamento e a desactivação do mundo rural, gerando a saturação de uma curta faixa do território - no litoral, são alguns exemplos de entre tantos outros que aqui poderiam ser focados.
Olhando hoje para a Lei de Bases do Ambiente, à luz da realidade existente e do seu distanciamento em relação à realidade desejável, verificamos que ela deve tornar-se mais clara, determinada e exigente na definição de alguns mecanismos tendentes à defesa de valores nela inscritos, designadamente pela introdução de um capítulo sobre zonas vulneráveis, com estatuto de protecção especial, como o litoral, as zonas húmidas e o mundo rural; ou pela introdução de exigências de cadastros e cartografias rigorosas; ou pela introdução de regras quanto à gestão dos espaços florestais; ou pelo reforço generalizado da prevenção e racionalização dos uso como forma de poupança de recursos, reforçando a ideia da perenidade e limitação dos recursos naturais; ou pela consagração das actividades de pequena escala e com menor impacto como mais consentâneas com a preservação ambiental; ou pela criação da obrigatoriedade de constituição de sistemas de monitorização e de sistemas de alerta para factores de risco; ou pela proibição da gestão e classificação de solos em função de factores especulativos; ou pelo reforço da componente da requalificação, seja de paisagens degradadas, seja de exploração de inertes e materiais radioactivos (onde se adopta também um princípio de limitação e prevenção na exploração); ou pela determinação de criação de espaços urbanos onde se promova o embelezamento e a existência de equipamentos fundamentais determinantes para a promoção de uma vida saudável; ou através de mecanismos de compensação às populações que habitam em espaços classificados, promovendo o gosto pela criação e defesa de áreas protegidas; ou pelo alargamento da iniciativa de áreas protegidas nacionais à Assembleia da República; ou lembrando taxativamente, nesta lei de valor reforçado, que a avaliação de impacte ambiental também gera recusa de aprovação de projectos, questão de que as entidades públicas muitas vezes se esquecem; ou pela garantia de financiamento e de meios técnicos e humanos para levar a cabo as determinações da Lei de Bases do Ambiente, entre outras questões.
Para além disso, torna-se igualmente visível que a actual Lei de Bases do Ambiente não toca alguns aspectos que se foram revelando domínios e desafios importantes da política para o ambiente, porque se trata de problemas e matérias que não eram estudados, avaliados e conhecidos devidamente à época da aprovação deste diploma, enquadrador da política de ambiente e de ordenamento do território, tais como a questão das alterações climáticas e da emissão de gases com efeito de estufa; ou a recusa de contaminação por organismos geneticamente modificados; ou a introdução do princípio da precaução que determina que em caso de dúvida não se implementem determinadas decisões e acções; ou pela criação de mais alguns instrumentos da política de ambiente necessários à melhoria de práticas como um código de boas condutas ambientais para diversos sectores de actividade.
É, ainda visível, feita a leitura da Lei de Bases do Ambiente, a necessidade de actualização de conceitos e mecanismos que, estando hoje generalizados na sua aplicação, não constam desta lei enquadradora, designadamente a avaliação de impacto ambiental (a actual lei só fala numa das suas componentes - o estudo de impacto ambiental), a avaliação ambiental estratégica, a licença ambiental, bem como a introdução de inúmeros instrumentos da política de ambiente e de ordenamento do território já concretizados.
Há, por outro lado, uma grande margem de manobra, ainda, na actual Lei de Bases do Ambiente para o reforço da participação pública, seja pela introdução de um artigo específico que dê nota da relevância do associativismo ambiental; seja pela inscrição de várias formas de participação dos cidadãos; seja, também, pela responsabilização legal dos agentes poluidores por mecanismos de prevenção, pela reparação de danos e pagamento de indemnizações devidas, acrescentando, em caso de denúncia e de completa indiferença das entidades públicas, a responsabilidade solidária destas últimas, em benefício da real existência dos direitos dos cidadãos.
Por último, torna-se confrangedor que a Lei de Bases do Ambiente tome, por exemplo, a poluição como uma componente ambiental (ainda que humana), conceito que urge alterar e deter numa formulação mais correcta (dentro das componentes antropogénicas, mas evidentemente não ambientais!)
São estes, assim, motivos suficientes para o PEV, nesta legislatura, ter assumido o compromisso de dar um contributo, ao nível parlamentar, para a alteração da Lei de Bases do Ambiente com os objectivos acima traçados e com as propostas acima exemplificadas.
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